sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Um dedo de Conversa com dr. José Chilaule


Nada é capaz de nos impedir de realizar os nossos sonhos. Nosso entrevistado é um exemplo vivo
  Nosso entrevistado é dr. José Chilaule, decente filiado a faculdade de Educação da UEM. Lecciona as cadeiras de Abordagem das Deficiências Mental (ADM) e Intervenção Especifica em NEE (IENEE). 
Reside no Bairro Hulene com os seus pais e familiares. Para além da docência gosta de praticar desporto (FUTSAL), aos finais de semana, escutar musica e conversar. Leia a seguir a entrevista completa.

1.        Em que momento da vida perdeu a visão? E como isso decorreu?
R: Perdi parcialmente a visão, aos 8 anos, e após uma cirurgia mal sucedida, perdi-a totalmente, aos 11 anos de idade, acontecia que tinha dificuldade de ver durante o dia, pelo que, precisava sentar junto ao quadro na Escola Primária 12 de Outubro (1ª classe) e de noite não enxergava nada.
2.        Quais as maiores dificuldades enfrentadas após a perda da visão?
R: Quando perdi a visão, na minha família existiam 2 grupos: o primeiro, que achava que estavisse tudo perdido, e que já não pudesse mais estudar e muito menos adquirir um grau superior. E o segundo, que após as recomendações dadas pelo oftalmologista que me atendeu durante e pós-cirurgia, que acreditava nas minhas capacidades, tendo sido, explicado da existência de uma escola especial na cidade da Beira, que acolhia pessoas como eu, e que podia continuar com os estudos.

3.        Onde se formou, adquiriu as suas habilitações literárias?
R: Antes de perder totalmente a visão, estudei numa escola regular na cidade de Maputo, no bairro de Hulene, que chamava-se Escola Primária 12 de Outubro, e fiz apenas a 1ª classe.
Depois da perda total, fui transferido para uma escola, então chamada de Escola Integrada da Beira. De 1ª a 5ª classe estive na mesma escola, que era mais um internato, onde aprendíamos todas as tarefas domésticas, desde cozinhar, lavar, passar, e até costurar nossa roupa. De 6ª a 12ª estava numa outra escola, que estive perto do internato (cerca de 1 hora andando a pé), e íamos sozinhos e não enfrentávamos dificuldades para lá chegar, e nem durante o período em que lá estive. Por fim, fiz o ensino superior na Universidade A Politécnica no período de 2006 à 2010.


4.        Quando entrou na Universidade Eduardo Mondlane (UEM)?
R: Concorri em 2010, em Janeiro, nos concursos normais que a UEM abre todos os anos. E após a submissão da candidatura, fui chamado para a entrevista no período entre Junho e Julho do mesmo ano. Foi a primeira e a única instituição em que concorri.


 5.        Quais as dificuldades enfrentadas na UEM?
R: Bem, as dificuldades nunca faltam, sobretudo quando és deficiente visual. Na UEM em particular, as maiores dificuldades resultaram do receio dos outros em relação a minha condição, ou seja, primeiro como iria relacionar-me com os colegas, e a reacção dos outros colegas para comigo. Mas, como sempre, existem os que de primeira se aproximaram, e criamos amizades, e os outros, que tem algum receio em relação a mim.

6.        Qual meio de transporte que usa para sua deslocação?
R: Do momento não tenho transporte pessoal, pelo que, uso os meios semi-colectivos, e por vezes, boleia de alguns colegas e/ou conhecidos.

7.         Actualmente, quais são constrangimentos existentes na família/comunidade em relação a deficiência visual?
R: Por ter provado a todos que tinha capacidades de estudar como qualquer outra criança, a minha família, me deu muito apoio e sempre esteve do meu lado, e mesmo aqueles que tiveram receio logo após a deficiência, agora estão confiantes, sobretudo quando entrei para o ensino superior em 2006.

8.         E na UEM?
R: Como disse, sempre existem receios quando se trata de pessoas com deficiências, sobretudo, visual. Embora alguns não sejam abertos ou acessíveis para comigo, tenho boas relações com todos, e a grande dificuldade que sinto dentro da UEM, é em relação a:

  1. Materiais: não há obras em braile; impressoras e laptop com software de voz para que eu possa usar, pelo que, preciso de arranjar matérias sozinho.
  2. Currículo de Psicologia de NEE: acredito que não estejamos a preparar adequadamente os estudantes, e precisamos trabalhar muito nisso, para que os psicólogos desta área, saiam efectivamente formados e com capacidades de ajudar a crianças/pessoas com NEE.
9.         Tem muitos amigos? E como é a relação com eles?
R: Tenho sim. Tenho muitos amigos na zona onde vivo, pois, como disse, vivo lá desde quando nasci, e, mesmo tendo-me ausentado para estudar na Beira, continuaram meus amigos até hoje. A relação com eles é espectacular, e brinco normalmente com eles, e eles já conhecem os meus defeitos e eu, os deles. É uma relação como qualquer outra.

Por Ercia Celeste
Reeditado por Cândida Muvale


 


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